terça-feira, 23 de outubro de 2012

Maria José Franca, As Mulheres da República: Maria Veleda




Grupo das Treze, fundado por Maria Veleda, em Maio de 1911, para combater a superstição. Em 1.º plano, sentadas a partir da direita: Judite Pontes Rodrigues, Carolina Amado, Ernestina Pereira Santos, Lídia de Oliveira, Maria Veleda, Antónia Silva e Adelina Marreiros. Em 2.º plano, em pé: Honorata de Carvalho, Mariana Silva, Filipa de Oliveira, Berta Vilar Coelho, Lénia Loyo Pequito e Carolina Rocha da Silva. (Foto legendada por Natividade Monteiro in «Memórias de Maria Veleda»)
Maria Veleda com o Jornal «República» na mão
Foto de família – em 1953: Sentados, da esq.ª para a direita: prima Justina, tia Alice, MARIA VELEDA, avó Arminda e a minha mãe (Laura, neta de Maria Veleda); em pé, da esq.ª para a direita: tio Pedro e tia Ester (netos de Maria veleda), avô Cândido (filho de Maria Veleda e do meu bisavô Cândido Guerreiro, poeta algarvio), tia Leonor e tio Cândido (netos de Maria Veleda)Maria Veleda
 
 
Homenagem a MARIA VELEDA – uma das mais notáveis Mulheres Republicanas
Maria Veleda é o pseudónimo de Maria Carolina Frederico Crispin, que nasceu em Faro (26 de Fevereiro de 1871) e morreu em Lisboa (8 de Abril de 1955). Pertencia a uma família da classe média, muito conhecida no meio social e cultural de Faro.
Maria Veleda - Há 101 anos, Maria Veleda já tinha começado a sua luta (desde 1905) em prol da República e dos ideais de «Liberdade, Igualdade, Fraternidade». Participou no «5 de outubro de 1910». Sofreu, chorou, também foi feliz. Viveu com intensidade todos os momentos da sua vida. Dedicou-se de alma e coração à sua família, que se prolongou na minha mãe, nas minhas tias, em mim, nos meus primos, no meu filho. Hoje e sempre - respeito, orgulho e AMOR por esta mulher de aspeto frágil mas de enorme fortaleza interior!
Aos quatro anos já sabia ler e escrever. Aos sete estreou-se no Teatro Lethes, represe…ntando um pequeno papel. Como o pai era responsável cultural da Sociedade Teatral de Faro, levava Maria Carolina muitas vezes para assistir a espetáculos, o que despertou nela a paixão pelo Teatro.
Com a morte do pai, em 1882, a família ficou em situação económica difícil. Assim, aos quinze anos, decidiu começar a trabalhar para ganhar a vida para não sobrecarregar a mãe e conquistar independência. Na época, as escolhas profissionais para as jovens eram muito limitadas: ser professora era uma das poucas profissões “aceitáveis” numa sociedade preconceituosa. Devido à sua pouca idade, esta rapariga tão corajosa optou pelo ensino particular, também devido à sua afetividade e amor pelas crianças.
Mais velha, e já numa carreira de intervenção pública, Maria Veleda acreditava no poder da educação sobre a sociedade, como fonte de felicidade e fator de progresso.
O amor pelas crianças levou Maria Carolina, com apenas dezanove anos, a adotar um bebé de catorze meses, filho da caseira da quinta dos pais, criança que ela levou para todo o lado e que educou como seu filho autêntico. Chamava-se Luís Frederico – bisavô do meu filho.
Sonhando ser escritora, começou a publicar poesia, contos e crónicas nos jornais regionais algarvios e alentejanos, ao lado de Francisco Xavier Cândido Guerreiro, mais conhecido pelos dois últimos nomes, poeta por quem teve uma paixão enorme. Deste grande amor, nascerá o meu avô Cândido Guerreiro Xavier da Franca (em 19 de Outubro de 1899), autor do livro No Sertão dos Diamantes, crónicas sobre os seus primeiros anos em Angola.
Maria Veleda recusará casar-se com o poeta, por não se julgar suficientemente amada. Acreditava que um casamento se devia fazer por amor e não por conveniências sociais. Assim, assumiu-se como mãe solteira num tempo cheio de preconceitos, criando e educando sozinha os dois filhos: Luís Frederico (adotivo) e Cândido Guerreiro (filho biológico).
Entre 1899 até 1905 foi professora do ensino primário em Odivelas (onde nasceu o filho) e Serpa. Continuou a publicar artigos, poemas e contos na imprensa regionalista. Em 1902, publicou a coleção «Biblioteca Infantil – Contos Cor-de-Rosa», em fascículos, com o objetivo de distrair e formar as crianças.
Em 1905, Maria Veleda vai para Lisboa: tinha trinta e quatro anos. Levava os dois filhos e a sua mãe. Passou grandes dificuldades económicas para alimentar a sua família. Trabalhou, como professora, num asilo e depois num colégio, de onde foi despedida porque tossia muito e desconfiavam que ela estivesse tuberculosa.
Mas como nem tudo corre mal, um dia, desempregada, soube por acaso que precisavam de uma professora no Centro Escolar Republicano Dr. Afonso Costa. Aceitou imediatamente e toda a família foi viver para o Centro, onde estava a escola. Data desta época o início do contacto de Maria Veleda com as principais personalidades republicanas da época, como Magalhães Lima, Ricardo Covões, Afonso Costa… quando ainda se vivia em Monarquia – era Rei D. Carlos I. Começou a minha bisavó a escrever para alguns jornais de Lisboa e a ter intervenções políticas nas sessões e comícios a favor da República. Alguns destes discursos e conferências foram publicados no livro A Conquista, prefaciado por António José de Almeida, sexto presidente da República Portuguesa.
E mesmo antes da Revolução do 5 de Outubro de 1910, inicia Maria Veleda a campanha em defesa da emancipação da mulher, em defesa da mulher grávida e das crianças exploradas e abandonadas.
Em 1908, organiza o 1.º Congresso do Livre Pensamento e é uma das sócias fundadoras de um movimento chamado Liga Republicana das Mulheres Portuguesas, em 28 de Agosto de 1908.
Sempre preocupada com o bem-estar das crianças e lutando para salvaguardar os seus direitos, fundou a Obra Maternal para acolher e educar crianças abandonadas ou em perigo moral, instituição que se manterá até 1916, graças à solidariedade da sociedade civil e às receitas obtidas em saraus teatrais, cujas peças dramáticas e cómicas Maria Veleda também escrevia e levava à cena. Dirigiu a revista «A Mulher e a Criança». Criou cursos noturnos no Centro Republicano Afonso Costa, onde era professora do ensino primário, e nos Centros Republicanos António José de Almeida e Boto Machado, para ensinar as mulheres a ler e a escrever e as educar civicamente, preparando-as para o exercício de uma profissão e participação na vida política. Combateu a prostituição, sobretudo a de menores. Fundou o “Grupo das Treze” para combater a superstição, o obscurantismo e o fanatismo religioso que afetava sobretudo as mulheres e as impedia de se libertarem dos preconceitos sociais.
Do Centro Republicano da Ajuda assistiu à implantação da República. As notícias contraditórias sobre quem ganhara, levaram-na a destruir documentos.
Depois do 5 de Outubro de 1910, integrou o Grupo Pró-Pátria e percorreu o país em missão de propaganda, discursando em defesa do regime ameaçado ainda pelos monárquicos resistentes. Envolveu-se também na propaganda a favor da entrada de Portugal na 1ª. Guerra Mundial.
No entanto, a instabilidade governativa e divergências internas entre republicanos, o assassinato do Presidente da República Sidónio Pais, em 1918,e os acontecimentos da «noite sangrenta» de 19 de Outubro de 1921 (em que foram assassinados, por forças da GNR, os heróis do 5 de Outubro) levaram a que Maria Veleda desistisse da vida política, desiludida com os sucessivos governos republicanos que não cumpriram os ideais de «Liberdade, Igualdade e Fraternidade». No entanto, continuou a publicar artigos em defesa da mulher e da criança e também poemas.
A desilusão com os caminhos políticos do seu País levou a que Maria Veleda se tivesse dedicado ao espiritualismo: fundou o «Grupo Espiritualista Luz e Amor» e, em 1925, dinamizou a organização do I Congresso Espírita Português e participou na criação da Federação Espírita Portuguesa. Fundou as Revistas A Asa, O Futuro e A Vanguarda Espírita; colaborou na imprensa espiritualista de todo o país, publicando poesia e artigos de pendor reflexivo e memorialista. Em 1950, publicou as «Memórias de Maria Veleda» no jornal República.
Desde 1912, que estava ao serviço da «Tutoria da Infância», primeiramente como Delegada de Vigilância, depois como Ajudante de Secretário, tendo-se reformado em Fevereiro de 1941 (quando completou setenta anos de idade) com uma pensão muito pequena. Morreu em 1955.
Em Abril de 2011, foi publicado, finalmente, o livro «Memórias de Maria Veleda». ORIGEM

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Educação da mulher em Portugal : entre finais do século xix e início do século xx: O Instituto de Odivelas

Aula na Casa da Luz, Almanach Bertrand, 1903, p. 366-369.
Aula na Casa da Luz, Almanach Bertrand, 1903, p. 366-369.

Dormitório na Casa da Luz, Almanach Bertrand, 1903, p. 366-369.
Dormitório na Casa da Luz, Almanach Bertrand, 1903, p. 366-369.
Recreio - Já em Odivelas, após as obras de adaptação, In Portugal Militar, Nº 2, 1º ano, Fevereiro de 1903, p.19.
Recreio - Já em Odivelas, após as obras de adaptação, In Portugal Militar, Nº 2, 1º ano, Fevereiro de 1903, p.19.



O Instituto de Odivelas (Infante D. Afonso) foi fundado pelo Infante D. Afonso Henriques, (1865 - 1920), Duque do Porto e Condestável do Reino, a 14 de janeiro de 1900.
A cerimónia de inauguração oficial foi presidida pelo Rei D. Carlos e contou com a presença da Família Real e de individualidades civis e militares. O ato oficial, com a assinatura do termo de inauguração, seguido de festa e de jantar, teve lugar no casa dos condes de Mossâmedes, na Estrada da Luz, em Lisboa. Igualmente ali, na chamada Casa da Luz, funcionou provisoriamente a escola, com 17 alunas, enquanto decorreram as obras no edifício do antigo Mosteiro de Odivelas. Em novembro de 1902, o Instituto Infante D. Affonso passou a funcionar nas instalações renovadas.


1. Da “iniciativa simpática” à inauguração.
Em 1898, um grupo de oficiais do Regimento n.º 1 de Infantaria da Rainha (D. Maria Pia) teve, de acordo com o jornal O Século de 27 de fevereiro, “uma iniciativa sympatica [e se] lembrou da fundação de um collégio para a educação das filhas de oficiais, nos mesmos termos do collégio militar”.
Também segundo a imprensa da época, “Foi um capitão d’esse regimento, o senhor Alfredo António Alves, quem alvitrou a fundação de um estabelecimento, analogo ao Colegio Militar, para educação e instrucção de filhas de officiaes, o qual, alem dos indispensáveis conhecimentos litterarios, desse ás educandas uma profissão honesta e em harmonia com a profissão dos paes.” E mais adiante: “… foi uma commissão solicitar da rainha D. Maria Pia, e de seu filho o infante D. Affonso, o patrocínio dos seus nomes e da sua influencia para a instituição nascente”. (Almanach Bertrand de 1903).
Entretanto, iniciaram-se os trabalhos preparatórios com a formação da Comissão Executiva, presidida pelo Infante D. Afonso, com vista à elaboração das bases dos Estatutos e à organização económica da futura instituição de ensino.

Ainda em 1898, a 4 de junho, a Rainha D. Maria Pia e o Infante D. Afonso visitaram o Mosteiro de Odivelas, edifício pedido ao Ministério da Fazenda para casa do futuro estabelecimento militar de ensino. Tal pedido acontecera dias antes, num ofício datado de 27 de maio onde o Infante D. Afonso indicava: “… edifício que muito convem seja o Convento de Odivellas, que magnificamente se presta aquelle fim." (Arquivo Histórico das Finanças – Institutos Religiosos, Freiras).
Por Decreto de 30 de maio de 1834 tinham sido extintas as Ordens Religiosas em Portugal e os bens dos mosteiros e conventos, quer masculinos, quer femininos, tornaram-se “bens da Fazenda Nacional”, ou seja, património do Estado. Em 1886, com a morte da última abadessa, o Mosteiro de Odivelas foi incorporado na Fazenda Nacional. Finalmente, a 6 de agosto de 1902 seria lavrado o auto de entrega do antigo convento, incluindo a propriedade rústica “Valle das Flores”, ao Instituto Infante D. Afonso.
A 9 de março de 1899, o Rei D. Carlos aprovou o Estatuto do Instituto Infante D. Afonso. Eis um excerto do seu Artigo 2º:
“Sob a protecção de Suas Magestades e Altezas é criado um colégio para instrução e educação de filhas (…) de oficiais combatentes e não combatentes da armada e dos exercitos do reyno e do ultramar, com a finalidade, (…) de dar as alunas a necessaria educação moral e religiosa, uma instrução geral e, alem disso, a instrução profissional que possa, de futuro, criar-lhes os precisos meios de subsistência.” (Ordem do Exército n.º 2 – 9 de março de 1899).
A criação do Instituto Infante D. Afonso teve, inicial e especialmente, como finalidade instruir e educar órfãs filhas de oficiais mortos em combate ou por doença. Com esse propósito fora, igualmente, criado o Real Colégio Militar, em 1803. Em França, já anteriormente, em 1807, tinha sido criado um colégio em Saint-Denis, próximo de Paris, a Maison d’ Éducation de La Légion d’Honneur, destinado às filhas dos oficiais franceses da Légion d’Honneur.
Os estatutos do colégio francês serão estudados e constituirão uma das fontes para a redação dos primeiros Estatutos do Instituto Infante D. Afonso. De referir que desde 1977, o IO e a MELH mantêm um intercâmbio anual, cultural e de línguas.
No dia 14 de janeiro de 1900 nasceu o Instituto Infante D. Afonso. O Conselheiro e General Luiz Augusto Pimentel Pinto foi o seu primeiro Diretor, (de 14 de janeiro de 1900 a 14 de outubro de 1911), e Albertina Lopes de Assis Gonçalves foi a Aluna nº 1.

Texto integral AQUI